A série Tiny Epic foi uma grande sacada comercial da Gamelyn Games. Com a premissa de criar grandes jogos em caixas pequenas, esses produtos sempre atraíram bastante a atenção do público. Scott Almes, o designer responsável por todos até aqui, empacotou em caixas pequenas, jogos compactos com mecânicas familiares e, em geral, eles funcionam bem.
O primeiro da série, Tiny Epic Kingdoms, é um 4X simples, mas gostoso e muito bacana. Ele recebeu mais tarde uma reedição acompanhada de expansão, que melhorou o jogo ainda mais. Em seguida veio o Tiny Epic Defenders (2015), um cooperativo com muitos elementos de dois excelentes jogos: Pandemic e Defenders of the Realm. A segunda edição, que também veio acompanhada da expansão, corrigiu alguns problemas menores e atualizou sua arte, que era, de fato, meio caída. Também em 2015, a Gamelyn Games lançou um jogo que seria o seu principal produto e o motivo do texto de hoje: Tiny Epic Galaxies. Posteriormente a série continuou com Tiny Epic Western, Tiny Epic Quest, Tiny Epic Zombies, Tiny Epic Mechs e, mais recentemente, Tiny Epic Tactics.
Bom, indo direto ao assunto de hoje, Tiny Epic Galaxies é um jogo competitivo de seleção de dados e gestão de recursos. Os jogadores ganham pontos melhorando seus próprios playerboards, que também os dão mais naves e dados, e através da colonização de planetas disponíveis em uma oferta. Os recursos disponíveis para isso são energia, que também pode ser gasta para permitir novos rolamentos de dados, e cultura, que permite ao jogador copiar uma ação de outro fora de seu próprio turno. O primeiro jogador a atingir o limite de 21 pontos vence a partida.
Em seu modo solo, incluído na caixa base, entramos em embate com as Rogue Galaxies! São oponentes predatórios que disputam conosco o controle de planetas e otimizam suas ações e seus playerboards mediante a aquisição e o gasto de energia e cultura de forma semelhante ao jogador, exceto pelo fato de que, diferentemente do jogador, a cultura lhes fornece mais rolamentos de dados, logo, mais ações. São cinco dificuldades possíveis para as Rogue Galaxies, nas quais a velocidade com que elas adquirem dados e pontos é tão maior quanto mais difícil o jogo.
Setup do jogo solo. À esquerda, em azul, minha galáxia. À direita, em vermelho, a Rogue Galaxy. O único componente que não está presente na versão nacional é o track de pontos, que é componente da expansão Beyond the Black.
Dados personalizados utilizados no jogo. Cada face representa uma ação possível. Uma vez selecionados, esses dados são colocados na Activation Bay para indicar que já foram utilizados. É possível, para mitigar os rolamentos ruins, rolar os dados de graça uma vez ou utilizar energia para fazer isso outras vezes. Alternativamente, você pode combinar dois dados que não serão utilizados para realizar uma única ação.
Playmat da Rogue Galaxy. Em todos os níveis de dificuldade, todas as naves estão disponíveis para uso desde o início. Adicionalmente, à direita, estão as ações de colônia que ela pode adquirir na medida em que sua galáxia for otimizada por meio do gasto de pontos de energia. Se, em algum momento, a Rogue Galaxy for otimizada até o nível da caveira, o jogador perde o jogo imediatamente.
O jogo solo emula de forma competente o multiplayer, a interação que o jogo proporciona é respeitada. Além disso, as regras não sofrem modificações drásticas e a Rogue Galaxy é razoavelmente fácil de se manipular. O antagonismo fornecido por ela traz desafios consideráveis e acho esse um dos modos solo com o melhor escalonamento de dificuldade. A versão épica da Rogue Galaxy é realmente difícil e eu me recordo de tê-la batido somente em uma ocasião. Depois que você joga algumas vezes, os caminhos para se vencer tornam-se bem claros e é gostoso ver de que forma a aleatoriedade dos dados e das cartas pode tentar derrubar seus planos. Adicionalmente, esse jogo tem algumas vantagens logísticas incríveis: é pequeno, logo, portátil, setup rápido e partida também rápida. Os componentes de madeira são bons, cartas com boa qualidade e dados personalizados, mas nada excepcional. O manual de regras é também bem feito e deixa pouca margem para dúvidas a respeito das regras. Por essas e por outras, acho TEG um grande jogo e, também, um grande produto! Há que deixar claro que tudo que falo nesse sentido é o que percebi a partir da minha cópia importada, não sei em que pé está a da Meeple BR. A julgar pelo trabalho que fizeram em outros jogos, acredito que estará boa.
TEG, todavia, pode desagradar algumas pessoas, pois tem enorme componente de aleatoriedade. Ela está presente na oferta dos planetas no tabuleiro, nos seus próprios dados e nos da Rogue Galaxy. Isso pode ser frustrante para algumas pessoas, mas não considero isso um defeito. Esse é um jogo de cartas e dados, afinal. A aleatoriedade é parte da premissa. Se você não gosta disso, procure outra coisa. Nem todo jogo vai agradar a todo mundo. Pessoalmente, enxergo a aleatoriedade como uma peça a mais do quebra-cabeças que o jogo propõe. Ela impede estratégias estanques e você tem que se adaptar ao que a mesa lhe oferece. Há maneiras de se mitigar os dados, sobretudo muitas oportunidades de novos rolamentos, e poderosas ações de cópia de ações a partir do gasto de pontos de cultura. Para as cartas de planetas disponbilizadas na oferta, todavia, não existe isso, salvo pelo raro efeito de alguns poderes de colônias. Você tem que se virar com o que aparece!
Como é um jogo com bastante aleatoriedade, TEG pode ter um comportamento errático em sua mesa, com algumas partidas sendo muito fáceis ou muito difíceis. Todavia, como são muito rápidas e também o é o setup, se você não curtir uma partida, monte outra e jogue logo. Acho que hoje em dia eu consigo jogar uma partida dele em menos de 30 minutos. Já cheguei a jogar 3 em seguida em uma hora!
Em suma, esse é um dice game com uma pitada de gestão de recursos que oferece um modo solo competente e divertido. Não é jogo para todo mundo, mas tem seu público garantido. Pessoalmente, gosto bastante do conjunto que ele oferece.
Resultado final de uma partida na dificuldade média, com 23 x 6 a meu favor. Nessa partida a Rogue Galaxy não chegou a ser um problema, mas esses eventos são raros, acreditem. Esse é um jogo que premia muito partidas repetidas, pois você aprende bem a estratégia e consegue vencer mesmo em níveis mais altos de dificuldade. O nível épico é insanamente difícil!
Além de esse ser um jogo legal, disponível no Brasil a um preço muito razoável, um dos motivos de eu ter tido vontade de resenhar o TEG foi uma coisa de sua história.
Quando esse jogo foi para o KS logo no começo de 2015, os jogos solo começavam a despontar. A 1 Player Guild crescia rapidamente, mas esses modos de jogo ainda eram muito raros. Para um dos stretch goals da campanha, os criadores resolveram fazer uma votação aberta no BGG, na qual deveria-se escolher entre componentes para um quinto jogador ou um modo solo dedicado. Por uma margem bastante estreita e com um total de votos expressivo, o modo solo ganhou, o que foi um resultado surpreendente naquele momento.
Imagem do post do BGG com a votação. Veja nesse link.
Isso foi um grande alerta para a comunidade e, sobretudo, para a indústria: os jogos solo tinham lugar e haviam chegado para ficar. Essa foi uma constatação não só minha, mas de muita gente boa do meio, como o Jamey Stegmaier. Nesse
post de seu blog, ele mesmo reconheceu esse fato. Muito mais do que como designer, ele tem meu respeito como homem de negócios. É inegável que sua companhia tem sucesso, bons produtos (não estou entrando no mérito se são bons jogos) e uma comunidade muito engajada. Muito disso fruto de se perceber coisas como essa.
De lá para cá, muita coisa mudou no quesito jogos solo. Hoje temos excelentes opções, tanto é fato que dos jogos do top 10 do BGG, pelo menos 6 apresentam modos solo oficiais (Gloomhaven, Pandemic Legacy Season 1, Terraforming Mars, Gaia Project, Scythe), ou extra-oficiais (Great Western Trail) bem avaliados por toda a comunidade. O Star Wars Rebellion estaria nessa lista também, mas o modo solo disponível é, com boa vontade, razoável, não está nem de longe à altura dos demais da lista.
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