rodrego::
Excelentes pontos como sempre, Moita. Como você e outras pessoas aqui apontaram, realmente reduzir a falta de inovação a falta de mecânicas registradas foi um pouco reducionista, uma tentativa minha de traduzir essa sensação com dados concretos.
Mas a sensação existe, e não acho que tenha a ver com o fato de eu jogar há bastante tempo. Jogar há bastante tempo talvez nos dê a capacidade de detectar os padrões que se repetem entre um jogo e outro, e que na minha opinião têm se repetido mais em jogos recentes do que nos jogos da década passada - vários jogos mais antigos que eu jogo agora continuam me parecendo em média mais originais do que os atuais
Pensando com mais clareza depois de acompanhar toda a discussão aqui e no Facebook, tenho a sensação de que de 2010 pra cá estamos sedimentando um pensamento crítico sobre BGs que não havia na década passada. Vários dos clássicos do BG são falhos em algumas coisas que hoje jamais seriam admissíveis: Agricola e Power Grid têm upkeep gigantesco, Tikal tem downtime bisonho, Brass tem zilhões de exceções, Princes of Florence pode ter jogador eliminado no meio, e por aí vai. E mesmo assim, pesados os gostos pessoais, são todos muito legais.
Hoje em dia, conceitos como downtime, frustração, flow, variabilidade, diversos caminhos para a vitória, número de decisões por turno, foram todos dissecados em muitas reviews e bem resolvidos em muitos jogos. Jogos como Pulsar, Yokohama ou Rajas of the Ganges fazem tudo certinho, são um primor da técnica. Mas talvez por obedecerem todas as fórmulas, acabam sendo menos originais. Não vejo porque jogar Pulsar e Rajas se posso jogar Yokohama, que eu adoro. Por mais que usem mecânicas diferentes, no final são todos jogos de otimização.
Me permite puxar uns exemplos do xadrez? O jogo que deu origem ao xadrez, o indiano
chaturanga, era um jogo muito muito muito ruim. Prova disso é que em
todos os lugares aonde ele chegou ele foi modificado. As soluções para os problemas existentes foi diferente em cada lugar, e isso deu origem a inúmeras variantes.
Pois bem, o "xadrez" que chegou na Europa (o árabe
shatranj) ainda era um jogo imaturo. Disso resultou uma explosão de modificações. Um surto de criatividade. Porém,
após essa fase de inovação, onde se atirava para todo lado,
veio uma fase de consolidação. E as regras findaram unificadas.
É isso que diferencia o xadrez europeu (mais conhecido como xadrez internacional ou xadrez FIDE) dos xadrezes orientais. Diferentemente do que aconteceu na Europa, na Ásia cada povo manteve sua variante nacional. E assim temos o makruk tailandês, o sittuyin birmanês, o ouk chatrang cambojano, o janggi coreano, o xiang qi chinês, o shogi japonês, o shatar mongol, o senterej etíope, etc...
Ok. Estou divagando. Aonde quero chegar? Que fases criativas costumam ser sucedidas por fases de consolidação. E até de extinção, como vemos com muita frequência na biologia. É o processo darwiniano em todo o seu esplendor. As inovações são geradas. Mas imediatamente a seguir elas são
selecionadas. Nem todos sobrevivem.
Porém, acho que podemos concluir que os jogos sobreviventes estão mais aptos a atenderem os diversos gostos do público. Assim como um nicho ecológico nunca deixa de ser preenchido por alguma forma de vida, não há demanda razoavelmente significativa por parte do público que não seja contemplada pela oferta da indústria. Até porque essa oferta tende a ser excessiva.