Segundo a Wikipédia “crítica é um comentário sobre determinado tema. A crítica é feita pelo crítico [...], que entra em contato com o produto a ser criticado[...]. Em geral, o crítico não pode apresentar uma avaliação puramente subjetiva, mas também deve apresentar descrição de aspectos objetivos que deem sustentação aos seus argumentos”.
Em geral, o crescimento de uma área traz consigo o desenvolvimento da crítica a seu respeito. Uma das primeiras formas de crítica a surgir na impressa foi a crítica literária. Era feita sobretudo pelos próprios escritores, que criticavam o trabalho dos seus pares. Já a crítica cinematográfica, que surgiria em seguida, fortaleceu a figura do crítico que não é autor, apenas se especializa na análise de determinada obra.
Hoje em dia, tanto literatura, quanto cinema ou gastronomia tem uma crítica muito bem estabelecida. Os cursos superiores dessas áreas podem ter seu foco na criação ou na avaliação crítica desses temas. Avaliar uma obra é uma atividade simples que pode ser feita sem maiores aprofundamentos. Entretanto, um crítico especializado busca utilizar critérios específicos, verificar qual a proposta da obra, em que nível tal proposta foi atingida e muitos outros fatores.
A diferenciação entre sujeito e objeto já foi superada e sabe-se que toda análise está permeada pela subjetividade do analisador. Tanto é que as conclusões críticas nunca são unânimes. Existem sempre críticos que se posicionam contra a qualidade de filmes ou livros considerados clássicos de grande excelência. No fim das contas, vale a máxima “cada opinião é tão boa quanto os argumentos que a sustentam”.
Crítica não é sobre obter respostas definitivas sobre uma obra. É sobre desenvolver uma técnica de análise e argumentação que enriqueça o debate sobre ela. Esse debate trouxe imensos frutos ao cinema, por exemplo. Foram de longos e enriquecedores debates sobre análise cinematográfica que se fortaleceram inúmeras noções como roteiro, direção, montagem, trilha sonora... E, principalmente, sobre qual a função de cada um desses elementos e se estão sendo bem ou mal executados. A crítica de cinema hoje possui inúmeros recursos a sua disposição e milhares de vozes e argumentos com os quais dialogar. Isso é extremamente benéfico para o cinema, inclusive é possível associar o crescimento da crítica de cinema com um aumento no prestigio do cinema, aumento tão grande que estuda-lo e analisa-lo é uma profissão, que se estuda em nossas universidades.
Nesse contexto, é fácil compreender os benefícios que uma crítica de boardgames sólida traria para a área. Entretanto, por mais que a área esteja crescendo bastante em relação a lançamento de jogos e pessoas na comunidade, ainda não há uma crítica de boardgames acompanhando esse ritmo.
Existem premiações, como o conceituado Spiel des Jahres, mas tais prêmios não são necessariamente fruto de uma análise puramente crítica (assim como o Oscar também não é) e os critérios utilizados ainda não são muito claros.
Existem diversos reviews de jogos, seja em texto ou vídeo. Entretanto, a maioria deles atua como guia de consumo, algo distinto da crítica. Um guia de consumo de propõe a apresentar um produto e dar ao consumidor em potencial informações úteis para que ele possa decidir se aquele produto é do seu agrado, e consequentemente irá compra-lo, ou não. Também são comuns no cinema, diferenciando-se das críticas pelo foco na apresentação e não na profundidade da análise.
Alguns reviews incluem uma análise do jogo, aproximando-se de uma crítica de fato, entretanto, a maioria costuma faze-lo de maneira tímida. Contudo, não acredito que seja justo cobrar isso dos autores desses reviews. Afinal, como podemos analisar board games em profundidade se sequer estabelecemos bem os critérios que deveriam guiar tal análise?
Acredito que o momento não seja de respostas, mas de perguntas. Para que sejamos capazes de nos aprofundar na análise de um board game: a interação entre suas mecânicas, a implementação de seu tema, a funcionalidade de seus componentes... Precisamos questionar qual a função desses elementos, dissecar exemplos de jogos que consideramos excelentes e compreender de onde vem a sua excelência. Dentre os jogos que consideramos problemáticos, é necessário que nos perguntemos qual a origem desses problemas e como afetam o jogo negativamente.
Não chegaremos a consensos, não é essa a ideia. Mas, a formulação de argumentos nesse sentido e principalmente o confronto entre argumentos diversos leva a um fortalecimento dos mesmos. E é sobre o alicerce de argumentos mais sólidos que é possível que nos aprofundemos no mundo dos board games não apenas para jogar, mas para analisar, criticar. Quem sabe um dia, chegaremos ao ponto onde formaremos designers e críticos de board games nas nossas universidades.
Prof. Lucas Andrade
.
.
.
Leia mais em: www.ludofaber.com