Escrita por: Rodrigo Neves.
Convidado para segunda opinião: Victor (Zavandor) do Canal Caverna dos Euros.
Sinopse do Jogo:
Macao é uma cidade que possuía um movimentado porto comercial português, no século XVII, na Ásia. Os comerciantes compravam seda, jade e especiarias na China, Japão e Índia, para depois e carregarem navios cheios dessas riquezas para as cidades prósperas da Europa. Neste jogo você é um comerciante em busca de prestígio, expandindo a cidade de Macao, trocando bens e ampliando sua rede de contatos com personagens influentes. Em um dos jogos mais renomados do designer Stefan Feld, temos aqui um jogo de 2 a 4 jogadores, que brilha com um sistema de cubos de ação caprichosamente polido, que favorece um jogo de decisões duras, formações de combos de cartas e um planejamento de médio/longo prazo bastante punitivo.
Mecânicas:
- Construção de Rotas,
- Pegar e Entregar,
- Rolagem de Dados,
- Seleção de Cartas,
- Sistema de Pontos de Ação,
- Gestão de Mão,
- Colecionar Componentes
Síntese do Jogo:
O jogo transcorre por 12 rodadas, cada uma dividida em 3 fases: aquisição de cartas, escolha de recursos para a rosa dos ventos e a fase de ações em si. Cada jogador recebe um tabuleiro individual, uma rosa dos ventos, doze marcadores de propriedade, cinco moedas, um disco para marcar pontuação, um disco para a muralha e um navio.

Entre as ações do jogo, cada jogador pode construir um distrito da cidade, pagando cubos de cores certas e colocando um dos seus tokens de propriedade lá. Os bens são distribuídos aleatoriamente, um em cada distrito, no início do jogo. Sua maior área de distritos conectados lhe dará pontos no final da partida. A mercadoria que você recebe pode ser trazida para a Europa, navegando com seu navio através do mar para o porto com demanda por aquele produto, onde você pode trocá-los por pontos de prestígio. Os navios podem ser movidos através gastando mais cubos. A muralha da cidade e os discos em cima da dela representam o quanto você tem influência na cidade, e indicam basicamente a ordem dos jogadores. Você pode avançar na muralha, adivinhe... gastando mais cubos. Do lado oposto à Macao no tabuleiro, existe a trilha do tributo, o lugar onde você, uma vez por rodada, pode trocar dinheiro por pontos de prestígio. A taxa depende das cartas abertas na primeira fase e muda a cada rodada.



Nas laterais do tabuleiro, temos doze espaços numerados, um para cada rodada. Nestes espaços colocamos um par de cartas de oficio durante a preparação do jogo. A cada rodada, à estas duas cartas, são adicionadas mais 4 cartas de edifícios ou pessoas. Todos os jogadores então escolherão, na ordem do jogador, uma carta para ser colocada em seu tabuleiro individual. Pegar as cartas é gratuito, mas seus poderes só poderão ser utilizados se antes elas forem ativadas. Como você ativa estas cartas? Fácil, gastando cubos coloridos indicados.



É possível perceber que tudo neste jogo gira em cima destes cubos de ação, certo? Então como poderemos obtê-los? Sua rosa dos ventos é um polígono heptágono, com sete lados, seis com os resultados das faces de um D6 e o último com uma seta. A cada rodada, os seis dados das cores dos cubos de ação são rolados e, em seguida, cada jogador deve escolher dois dados (ou duas cores) e colocar esta quantidade de cubos desta cor, no lado numérico correspondente da rosa do vento. Então a rosa dos ventos é girada no sentido horário e você ganha para a rodada atual, todos os cubos que estão em frente da seta. Estes cubos podem ser gastos para ativar cartas, construir um distrito, avançar na muralha, mover seu navio e usar cartas ativas.



Durante o jogo você corre o risco de receber fichas de punição, que valem menos três pontos cada ao fim da partida. Elas ocorrem quando seu tabuleiro está cheio, quando inicia sua fase ações e você não tem nenhum cubo a disposição para gastar e para cada carta inativa que sobrar em seu tabuleiro no final do jogo. O jogo termina após doze rodadas. Então você receberá ou perderá pontos extras de acordo com seus tokens de punição, cartas com condições de 'final de jogo' e a quantidade de distrito em sua maior área. Aquele com mais pontos vence Macao.
Avaliação:
Macao é um jogo que pune rigorosamente os erros de planejamento dos jogadores... e isto, é muito lindo... Ele traz muitas decisões que literalmente são desafiadoras. Primeiro você precisa gerenciar a sua oferta de cubos, escolhendo os dados certos no momento certo. Por exemplo, quando você escolhe o número seis, você receberá muitos cubos, mas você só terá acesso a eles depois de seis rodadas, escolha o número um, você receberá apenas um cubo, mas poderá usá-lo imediatamente. Cruel não? Uma desvantagem deste sistema é que durante as duas primeiras rodadas você tem acesso a muito poucos cubos e, portanto, o jogo demorar a decolar... já inicia com uma leve frustração de impotência. Uma segunda parte importante do jogo são as cartas. Para usar os benefícios delas você precisa antes ativá-las. Mas, para ativá-las você precisa de cubos com as cores certas. Para obter cubos da cor certa, no momento certo, você precisa planejar com antecedência. E agora o paradoxo... como você pode planejar com antecedência, se as cartas são sorteadas de forma aleatória no início de cada rodada. Apenas as cartas de oficio são visíveis ao longo do jogo, e as ações delas são bem limitadas comparadas as demais.
Neste ponto, a disputa na muralha é importante quando você joga com três ou quatro jogadores. O jogador que está à frente na "Muralha" terá a primeira escolha na oferta das cartas. E esta será uma grande vantagem, pois torna mais fácil para ele perseguir uma estratégia específica desde o início do jogo. Deixar um jogador ir se distanciando na muralha sem disputa, pode ser um dos erros mais caros do jogo.
Outro ponto primoroso aqui é o mecanismo da rosa dos ventos. É inegavelmente divertido (tentar) planejar com antecedência suas jogadas. Uma pena que as cartas sejam tão aleatórias. Considerando ainda que algumas cartas são mais poderosas do que outras, pode ocorrer da sorte influenciar de forma relevante em algum momento do jogo. Uma das decisões mais delicadas do jogo é a compra de pontos de prestígio com dinheiro. Que fique claro... o dinheiro neste jogo é minerado com sangue e suor, e muito difícil de guardar. As cartas alteram a cada rodada, o câmbio para compra de prestigio por dinheiro. Em algumas rodadas, o prestígio é incrivelmente barato, e em outras, bem salgado. Os jogadores devem comprar seu prestígio sabiamente.
Um dos aspectos mais divertidos em Macao é a oportunidade de criar grandes combos com as combinações das cartas ativadas, cujas habilidades podem ser encadeadas, gerando muito dinheiro ou pontos de vitória em uma única rodada bem planejada.
Como um dos pontos fracos, posso citar que Macao é um jogo bastante sensível ao AP. Para os jogadores mais novos então... A decisão sobre qual carta escolher, que dados usar, como gastar seus cubos... são muitas opções correlatas. No início da primeira partida, nos deparamos com um montante esmagador de escolhas e poucos recursos, o que gera aquela sensação de um jogo pesado e o sentimento do "eu não sei o que estou fazendo" bate forte. No entanto, ao final da partida você já terá uma visão macro do jogo mais clara e uma segunda partida será certamente mais agradável.
O tema em Macao não é muito forte. O único mecanismo temático que existe, é o pickup and delivery de mercadorias exóticas para o velho mundo. Eu adoro jogos com tema bem trabalhada. Um bom tema a ajuda na imersão, na entrega do jogador à partida e é responsável por garantir uma experiência memorável. Para mim é combustível para diversão... Mas um tema não é uma condição necessária para um jogo ser divertido. Macao é um bom contra-exemplo. Tema raso, jogabilidade complexa e profunda... um jogo prazeroso de colocar na mesa.
Segunda Opinião por: Victor Caminha (Zavandor)
ou 
O Rodrigo pediu que contribuísse para o texto dele - não que veja necessidade, dada a qualidade costumeira de suas resenhas - então resolvi colocar alguns pontos importantes sobre o jogo. Espero que gostem e torço para que esse jogo volte a ser reimpresso, pois certamente merece!
A crueldade está aqui! Considero Macao o segundo melhor jogo do Stefan Feld, perdendo apenas para o In the Year of the Dragon. Assim como aquele jogo, Macao possui um aspecto cruel na mecânica, desta vez no gerenciamento das cartas. Você perde pontos de vitória - e as vezes em rodadas consecutivas - se não conseguir baixar cartas e sua mão "estourar". Você perde pontos de vitória se no final do jogo não ter conseguido baixar TODAS as cartas que recebeu. Você perde pontos de vitória se em alguma rodada ficou sem cubos.
Uma repaginada nos componentes seria bem-vinda. Um ponto que considero problemático, entretanto, se deve aos componentes do jogo. Não me refiro só a parte estética (considero as moedas do Macao hediondas), mas também sobre o texto nas cartas. Ok, o jogo definitivamente depende de idioma, mas poderiam tornar a sua leitura mais fácil. Por exemplo, o uso de siglas que são bem menos intuitivas do que símbolos:
- AC significa Action cube (por que não usar ao invés o ícone de um cubo da cor específica ou um cubo com um "?")
- GC significa Gold Coin (por que não usar ao invés o ícone de uma moeda?)
- PP significa prestige point (por que não criar um símbolo de ponto de vitória, com um número ao lado?)
O fato das cartas serem pequenas não ajuda essa leitura. Alguns termos também poderiam ser melhor referenciados. Um ponto que pode confundir novatos são os tipos de cartas, que são citadas por extenso: office (tem o ícone do pergaminho), people (tem o ícone de um homem barbudo) e building (tem o ícone de um prédio). Adoraria que se o Macao fosse relançado as cartas fossem impressas em um tamanho maior, para que pudessem usar no texto da carta esses ícones ao invés de palavras. Finalmente, um termo que confunde jogadores é "activate a card" (ativar carta). Este termo nada mais é que pagar o custo da carta e NÃO é utilizar o poder desta. E quando se fala em "activated cards" se referem às cartas que já foram pagas. Podiam ter usado uma terminologia melhor.
Escassez sempre presente, especialmente para os retardatários na iniciativa! Além dos jogadores sentirem sempre aquela necessidade de mais cubos (e costumo dizer, se não sabe que dados/cor escolher, pegue os dados que darão mais cubos), o dinheiro no Macao é MUITO escasso. É preciso correr atrás de cartas que possam lhe fornecer dinheiro se quer ter alguma esperança de comprar os pontos de vitória que são ofertados a cada rodada. Um outro ponto interessante é a importância da ordem de iniciativa neste jogo (salvo se tiver alguma estratégia de "jogar atrás"). Similar ao In the Year of the Dragon, mas em menor escala, jogar mais tarde pode lhe custar uma carta importante, um setor crucial da cidade ou uma entrega de mercadorias que lhe concederia mais pontos se o seu oponente já não tivesse entregado também. A iniciativa ainda é mais importante em um jogo com 4 jogadores.
Quantos combos de cartas existem? Apesar da descrição geral parecer negativa sobre a crueldade do jogo (que para mim, é positivo) e da qualidade dos componentes, quero ressaltar que é muito satisfatório conseguir fazer sua estratégia funcionar durante as partidas, alavancada principalmente pelas cartas que baixou. A grande quantidade de cartas assegura uma excelente rejogabilidade e certamente o jogo não se esgotou para mim, desde quando o adquiri em seu lançamento, anos atrás. Definitivamente recomendo para os eurogamers masoquistas e que curtam cobertor curto e combos de cartas!