Escrita por: Rodrigo Neves.
Ambientação:
"Jornada ao Oeste" é um romance mitológico do escritor chinês Wu Chengen, escrito por volta de 1570, durante a Dinastia Ming. A lenda baseia-se na peregrinação de um monge para a Índia, em busca de escrituras sagradas do budismo e conta a história da lenda chinesa do Rei Macaco. A peregrinação do monge foi real, inclusive sua viagem consolidou o desenvolvimento do budismo no Extremo Oriente, mas com o passar do tempo, diversas lendas foram fundidas à história real, que foi ganhando versões cada vez mais fantásticas. Jornada ao Oeste é um marco na literatura mundial, comparado com o épico ocidental Odisséia de Homero. Uma narrativa cheia de intrigas, demônios, monstros e outras criaturas malignas que estão atrás do monge. Para combater todas estas ameaças, o Rei Macaco vai utilizar seus poderes, dignos de um super-herói da Marvel: imunidade contra fogo, água e qualquer instrumento cortante, pode voar montado em nuvens e névoas, carregar uma montanha em cada ombro, ficar invisível e transformar-se em qualquer coisa, seja animal vegetal ou mineral.


Sinopse:
Journey: Wrath of Demons é um jogo de miniaturas cooperativo para 1-4 jogadores, lançado em 2014, baseado no clássico romance chinês “Jornada ao Oeste”. Nele quatro peregrinos: Tripitaka, Rei Macaco, Monge Sha e Cho Hakkai se unem para vasculhar a China antiga em busca dos sutras, escrituras sagradas que trarão salvação para um mundo dominado por Demônios. Tripitaka é único humano, no estereótipo monge careca, o mais fraco da equipe, porém o único capaz de resgatar sutras, selar portais e ressuscitar amigos... O cara é o centro das atenções, tanto que a prioridade número um da inteligência artificial do demônios é “atacar Tripitaka”. Os demais membros da equipe são personagens folclóricos humanóides que precisam “descer a lenha” e manter o Tripitaka vivo.
Síntese do Jogo:
Um dos pontos fortes do jogo é a sua qualidade de produção. As miniaturas impressionam bastante, são bem esculpidas, detalhadas e em tamanho GG. Os jogadores precisam controlar quatro peregrinos: Tripitaka, Rei Macaco, Monge Sha e Cho Hakkai, e todos os cenários são feitos para os quatro participarem. Em casos de partidas com 3 ou menos jogadores, alguns irão ter que controlar dois ou mais personagens. O jogo é leve em regras e os personagens não conseguem usar muitas habilidades em um mesmo cenário. Assim, não é complexo controlar mais de um personagem, caso os jogadores tenham alguma experiência com jogos de tabuleiro. Entretanto, no jogo solo, onde uma única pessoa controla os quatro heróis, pode dar uma enrolada forte por serem muitas habilidades e condições acumuladas.





Cada herói tem um playerboard individual para controlar seus atributos: pontos de vida, ataque, defesa, movimento e capacidade de realizar o ritual de purificação. Além disto, existem contadores circulares para acumular Karma Bom, Karma Mal e Chi, usados como custos para adquirir novas habilidades, melhorar no combate ou como custo para usar as habilidades em vigor. Cada personagem possui um range diferente de ataque, muito bem ilustrado também em seu tabuleiro individual. A movimentação dos personagens é meio travada por conta do formato intrincado dos cenários e das bases de formatos variados das minis. Porém, como cada personagem tem uma área de ataque diferente, isto acaba compensando e equilibrando a situação. Traz uma ar meio de quebra-cabeças, na organização do front de batalha e na hora de invadir um templo ou cabana... bem legal e desafiador.




Cada peregrino tem seu próprio deck de habilidades, com focos diferentes para dar uma assimetria legal aos jogadores. O Rei Macaco por exemplo tem mais habilidades de movimento e ataques individuais poderosos. Cho Hakkai tem poderosas habilidades de ataques a múltiplos oponentes e Tripitaka tem habilidades mais clericais, focadas em curar, recuperar e proteger. Os decks não tem tantas cartas e como os cenários usam poucas por partida, creio que o objetivo delas seja fornecer maior rejogabilidade aos personagens mesmo. Cada um tem uma arma em três níveis, que podem ser evoluídas ao longo da partida.



Os demônios são um show a parte!!! As miniaturas são lindas, maneiríssimas e absurdamente grandes. A maioria tem pelo menos o dobro do tamanho de outras minis clássicas da CMON ou FFG. O principal inimigo neste jogo é o Rei Demônio Touro e seus vários lacaios touros-demônios. A primeira vista, parece que os inimigos são diversas espécies de minotauros: com clava, arco e flecha, martelo e até uma espécie de minotauro-centauro. Cada um vem com sua própria carta de estatísticas. Apenas o chefão tem um board com pontos de vida acumulativos, a maioria de tem um HP que precisa ser batido em um único ataque, senão é falha mesmo.

Comparação com as miniaturas do Zombicide.
O jogo funciona por cenários e sempre os quatro peregrinos estarão em jogo. Após o setup do cenário escolhido, a partida rolará em diversos turnos, com as fases: manutenção, ativação dos peregrinos, spaw e ativação dos demônios e fim de turno. Os peregrinos têm dois pontos ação por turno e suas opções são variadas. Eles podem se mover pelo board, respeitando as cores de linhas que indicam obstáculos, pontos altos, inacessíveis. Também podem atacar os demônios com dados e habilidades especiais. Ao ser morto os demônios trazem pontos “karma ruim” que servirão para evoluir a habilidade em armas dos personagens, mas trarão juntos cartas de corrupção com fortes restrições aos heróis. Ou, ao invés de matar, os peregrinos podem tentar fazer um ritual de purificação nos demônios derrotados. Em caso de sucesso, eles recebem pontos de “karma bom” que poderão ser trocados mais a frente por habilidades permanentes. O problema é quando estes rituais falham, pois isto revigora o demônio e ele voltará para continuar a briga no próximo turno.


Os peregrinos também podem gastar seus pontos de ação para resgatar aldeões, pegar sutras, abrir portar, recuperar HP em fontes ou descansar para recuperar o Chi (usado como custo para ativação das suas habilidades). Quando os heróis se encontram em um tile com uma “mystical box” eles podem gastar ações rezando para ganhar cartas de fortuna que dão pequenos benefícios. Ou podem optar por meditar... neste caso, eles acionam um dispositivo tipo uma bússola, onde a agulha gira e para no ying/yang. Em caso de sucesso, eles pegam três cartas de fortuna e ficam com uma. Em caso de fracasso, eles recebem uma carta de desfortunio, com algum prejuízo relevante à ele ou ao grupo.



A ativação dos demônios começa com a compra de uma carta que irá dar spaw neles, movimentos/ações/ataques extras naquele turno, reativar todos no tabuleiro, etc... Em seguida, todos ativam duas ações também, que podem ser mover (na direção de Tripitaka) ou atacar (Tripitaka, lógico. Caso não seja possível, eles vão usar seus ataques para remover seus obstáculos antes).
Avaliação:
Em primeiro lugar as miniaturas são muito bem esculpidas e gigantes... a maioria tem pelo menos o dobro do tamanho de outras minis clássicas da CMON ou FFG. A arte do board modular e demais tokens é espetacular também, cores vivas e material muito espesso. É impressionante o esmero na produção deste jogo.
Journey é um jogo de fácil aprendizado, com um conjunto de regras pouco burocrático. Apesar de não ser uma opinião comum no nosso hobby, eu sempre dei preferência a tensão e diversão gerada por uma partida de Zombicide, do que uma partida mais burocrática de Descent, por exemplo. Os cooperativos dungeon crawler representam uma classe de jogos temáticos, que por definição trarão uma experiência mais imersiva e despretenciosa que um euro padrão. Particularmente, sempre achei que aumentar o desafio aqui com mais regras, exceções, tabelas e detalhes, sacrifica demais a diversão. Neste ponto, o conjunto de regras mais simplórias do Zombicide acabam sendo mais interessantes que outros clássicos mais "heavy". Journey: Wrath of Demons entra como uma opção muito interessante, pois consegue manter a imersão e diversão, mas com um conjunto de regras intermediário, sem ser leve demais ou pesado demais.
O manual do jogo tem 48 páginas de regras, porém uma com leitura simples, técnica, agradável. São muitos exemplos e ilustrações bem elucidativas. Ele funciona no esquema clássico de spawn e gates. Porém, a movimentação dos personagens e monstros é meio travada por conta do formato dos cenários e das bases de formatos variados das miniaturas. Por outro lado, como cada personagem tem uma área de ataque diferente e muitas vezes múltipla (todos os demônios atacam múltiplos alvos com um ataque), existe uma compensação aqui, criando desafios extras para os movimentos atuais e programação dos futuros.
Muitas cartas de habilidade e dados personalizados se combinam para criar uma atmosfera de ação rápida e tensa, além de decisões críticas para evolução dos peregrinos durante o jogo, dado que não existe tempo para muitos aprimoramentos em um único cenário. Cada partida leva de 60 minutos a 100 minutos, dependendo da missão e grau de AP dos jogadores, e o core básico vem com 10 cenários bem variados. A dependência de idioma neste jogo é moderada, se um jogador não souber inglês, precisará de uma planilha traduzida ou cartas traduzidas.