Escrito por: Filosofo_R (Rodrigo Monsores)

Figura 1 – Arte da Capa.
“Que buscais, herói?”.
”Se és pitonisa, sabes a pergunta, e também a resposta”.
Sem nada dizer, a pitonisa de Delfos lançou um pó reluzente como estrelas sobre uma pira em chamas, dela fazendo erguer densa fumaça. Inalando os vapores lentamente, seus olhos reviraram e entrou em transe profundo. Após alguns momentos de pausa, com uma voz retumbante, quase fantasmagórica, finalmente proferiu a profecia.
“Outras terras da Hélade irás visitar... Tebas, Corinto, Creta, Estinfale, Rodes, Éfeso, Atenas... Heróis, artefatos e poderes deverás buscar... Outros como tu estarão nessa busca, e dela, triunfante, um semideus sairá...”.
A pitonisa estremeceu violentamente como se estivesse sendo eletrocutada e desmaiou. Os servos do templo correram em acudi-la.
Decepcionado com a profecia, você se vira em direção à saída. Esperava ter uma resposta mais conclusiva, mas a profecia recebida mais uma vez deixava uma dupla interpretação. Triunfante, um semideus sairá... Esse semideus tanto podia ser você, como qualquer outro. Reinos já haviam caído graças a interpretações errôneas obtidas em oráculos. Contudo, você esperava um pouco mais do Oráculo de Delfos, o mais famoso de toda a Hélade.
Ainda assim, obtivera informações importantes sobre quais locais deveria buscar. Restava agora ser rápido, pois filhos de Zeus, Atena, Ares, Hades e outros deuses desejavam a mesma coisa: um lugar pétreo no Olimpo e a glória de ser considerado verdadeiramente um deus.
Chegando ao cais, você é alcançado pelo imediato de seu navio. Assustado, ele fala aos borbotões.
“Senhor, será impossível zarparmos hoje. Uma grande tempestade se aproxima!”.
“Nenhuma tempestade jamais me assustou”.
Você sobe em sua embarcação, estende suas mãos em direção ao mar e sussurra palavras incompreensíveis a todos. Em questão de segundos, o mar se acalma perante o filho de Poseidon, destinado à glória perpétua do Olimpo.
TEMA:
Em Elysium, os jogadores são semideuses que ambicionam um lugar no Olimpo, ao lado de Zeus, deus dos deuses. Para conseguir tal feito, devem reunir heróis, artefatos e poderes, além de completar missões heróicas, para forjar suas próprias lendas e eternizá-las no Elysium, morada perpétua dos eleitos pelos deuses. Quem forjar as lendas mais imponentes será o vencedor.
OBJETIVO:
Obter mais pontos de vitória ao cumprir missões heróicas (Quests) e adquirir cartas de cinco famílias de deuses diferentes e reuni-las em lendas, no Elysium.
DADOS TÉCNICOS
N° de Jogadores: 2 a 4.
Tempo médio de partida: 1h.
Edição: Space Cowboys (2015).
Designers: Matthew Dustan e Brett J. Gilbert.
Mecânicas envolvidas:
- Drafting
- Formação de Tableau
- Set Collection (coleção de cartas, no caso);
- Administração de recursos (no caso, ouro).
COMPONENTES:
São muitos componentes, todos muito bem acabados. Destaque para o insert do jogo, em que cabem todas as cartas já com sleeves, sendo que há um nicho para cada família de cartas, o que agiliza muito o setup. Em resumo, os componentes são:
- 1 Templo, composto de duas partes: O frontão, formado por dois lados diferentes e com símbolos coloridos que indicam o requisito para cumprir as quests; a base, em que marcamos a época ou rodada do jogo em que estamos;
- 168 cartas divididas em 8 famílias de deuses diferentes (Zeus, Atena, Hades, Poseidon, Hermes, Apolo, Hefestos e Ares);
- 1 Tabuleiro de Oráculo;
- 16 colunas divididas em 4 cores (amarelo, azul, vermelho e verde);
- 6 “Quest Tiles” (Tiles de Missão);
- 4 discos de marcação da ordem do turno;
- 1 marcador de época;
- 12 anéis de “Trigger” (ativação de poder);
- 4 tabuleiros de jogador;
- 4 cartas de ajuda;
- 19 “Bonus Tiles” (pontuação bônus);
- 40 Gold Tokens (moedas);
- 25 Prestige Point Tokens (marcadores de pontos de prestígio);
- 45 marcadores de pontos de vitória;
- 1 manual e 1 guia contendo explicação detalhada de todas as cartas do jogo, organizadas em seção de acordo com a família a que pertencem.
Figura 2 – O belo e funcional insert do jogo.
O JOGO
É mais simples do que parece à primeira vista. As cartas possuem uma iconografia simples e que faz sentido em relação aos seus efeitos ou ações, mas em um primeiro contato, o jogador pode se sentir um pouco perdido em relação aos símbolos. Mesmo assim, há um pequeno texto em cada carta explicando exatamente o que ela faz. Em caso de dúvida, ainda há o livro de ajuda, que consultei apenas uma vez na minha primeira partida, ou seja, o jogo é bem intuitivo uma vez que se entenda sua dinâmica.
Basicamente, cada época é dividida em fases, que são quatro:
I – Despertar
Forma-se o “Agora” que é a área de oferta de cartas para os jogadores. Abre-se certo número de cartas a partir do monte de compras (o n° muda de acordo com a quantidade de jogadores); se Apolo estiver em jogo, o Oráculo também estará, então deslizam-se as cartas do Oráculo para o Agora, completando-se o número com cartas da pilha de compras; o Oráculo é preenchido com novas cartas, que estarão presentes no Agora da próxima época.
II – Ações
Aqui acontece a fase de draft e formação de Tableau. Cada jogador, na sua vez, deve usar uma ou mais de suas colunas para adquirir as cartas do Agora ou uma das Quests (missões) disponíveis. Cartas adquiridas vão para a área acima do tabuleiro do jogador, chamada de domínio (DOMAIN). Quests adquiridas ficam ao lado do tabuleiro do jogador. Em seguida, após ter adquirido uma carta ou quest, o jogador deve se desfazer de uma de suas colunas, à sua escolha. Não precisa ser a coluna utilizada para adquirir a carta. É aqui que a estratégia faz toda a diferença, pois ao descartar a coluna vermelha, por exemplo, você estará abrindo mão de quaisquer cartas ou quests que tenham símbolos vermelhos em seus custos. Então, a todo o momento, o jogador é pressionado no sentido de tomar decisões importantes, e é possível sim bloquear o adversário, sobretudo na escolha das quests.
É preciso sempre avaliar o que é mais importante: conseguir aquela carta nível 2 de Apolo que vai me dar uma grande vantagem para completar minha lenda no Elysium ou eu corro e escolho logo a quest, para garantir uma boa quantidade de ouro e de transferências para o Elysium? Prejudicar o adversário nem sempre será a melhor opção, mas às vezes será vital. E você mesmo pode ser prejudicado a qualquer instante e ficar sem nenhuma quest. Nessa fase, é possível usar o poder da maioria das cartas, e é preciso estar atento para não perder a oportunidade de ativações das cartas.
Ao final dessa fase, o jogador deverá ter conquistado para o seu tableau: 1 quest (concluída ou não) e 3 cartas (podendo incluir cidadões, ver detalhes abaixo).
III – Escrevendo as Lendas
Primeiro altera-se a ordem de ativação dessa fase, que é definida pelo número das quests concluídas pelos jogadores. Assim, quem pegou a quest 1 será o primeiro, recebendo o disco 1, quem concluiu a quest 2 será o segundo, etc. Essa também será a ordem no início da próxima época. O jogador que não concluiu uma quest (não tinha coluna correspondente para pegar nenhuma quest na fase anterior) fica com a quest incompleta e recebe o maior número possível, sendo o último a jogar. Essa desvantagem não é só na ordem: ele recebe menos ouro e transferências do que se tivesse concluído a quest, daí a importância de se preocupar com ela.
Em seguida, o primeiro jogador recebe pontos de vitória e ouro mostrados em sua quest. Ele então poderá transferir certo n° de cartas do seu domínio para o Elysium. Esse número de transferências é mostrado em sua quest (símbolo da lira). Para cada carta transferida para o Elysium, ele deverá pagar um custo em moedas de ouro igual ao nível da carta. Assim, começa seu set collection formando famílias (lendas) de dois tipos:
Lendas de Níveis: Cartas de mesmo nível, mas de deuses diferentes. Ex: Lenda de Nível 1: 1 de Apollo, 1 de Zeus, 1 de Atena. O máximo de cartas nesse tipo de lenda é 5.
Lendas de deuses: Cartas de níveis diferentes, mas do mesmo deus. Ex: 1 de Apollo, 2 de Apollo, 3 de Apollo. O máximo de cartas nesse tipo de lenda é 3.
Figura 3 – Cartas da família de Poseidon
O jogador que tiver mais cartas em uma lenda de nível receberá um bônus temporário referente aquele nível, ou seja, se um jogador fizer uma lenda maior, toma o marcador de bônus dele. O primeiro jogador que concluir uma Lenda de deus, receberá o marcador de 5 pontos de bônus referente àquele deus; o segundo a concluir uma Lenda desse tipo recebe o marcador de 2 pontos bônus (esses marcadores são definitivos e vão para quem concluí-los antes; um mesmo jogador pode receber os 2 marcadores).
As lendas podem incluir um cidadão, desde que a lenda possua pelo menos 2 cartas nela. O cidadão é uma espécie de Joker no jogo, ele pode substituir uma carta de qualquer nível em qualquer lenda. Você recebe um cidadão toda vez que já adquiriu uma quest e não consegue mais pegar nenhuma carta do Agora (porque você não possui coluna do tipo correspondente). Basta pegar uma carta da pilha de compras, mantendo-a virada para baixo. Para adicionar um cidadão a uma lenda, você paga uma quantidade em ouro igual ao nível da carta que o cidadão está substituindo na lenda. Contudo, nem tudo são flores. Cada cidadão no Elysium vale -2 pontos ao final do jogo, portanto, use esse recurso com cautela!
IV – Fim da Época
Quando todos os jogadores encerrarem suas transferências, a época (rodada) termina. As quests são devolvidas ao templo, todas as colunas são recuperadas e as cartas viradas são desviradas para poderem ser usadas novamente no próximo turno. O marcador de época no templo é avançado para o próximo número.
Figura 4 – Domínio, Elysium e elementos diversos do jogo
FIM DO JOGO E PONTUAÇÃO FINAL:
O jogo termina ao final da quinta época. Para a contagem dos pontos, primeiro removem-se do jogo todas as cartas presentes no domínio dos jogadores e as cartas isoladas no Elysium. Somam-se os pontos das cartas com o símbolo de poder do Chronos (elas só ativam na pontuação final). Contam-se os pontos bônus e os pontos para cada lenda presente no Elysium, conforme o seguinte:
Cada Lenda de deuses: 2 cartas = 3 VP / 3 cartas = 6 VP
Cada Lenda de níveis: 2 cartas = 2 VP / 3 cartas = 4 VP / 4 cartas = 8 VP / 5 cartas = 12 VP
Se Ares estava em jogo, contam-se os pontos de prestígio obtidos pelos jogadores, da seguinte forma:
O jogador com mais PP marca 16 pontos de vitória. O próximo jogador marca 8, o seguinte 4 e o último, 2 pontos. Em caso de empate, basta dividir os pontos de vitória dos jogadores empatados (ex: 2 jogadores empataram em segundo, cada um recebe 4 pontos de vitória em vez de 8).
Após somar todos os pontos, o jogador com maior pontuação vence. No caso de empate, o jogador com a maior quantidade de ouro restante entre os jogadores empatados vence.
ANÁLISE:
Elysium é um jogo de desenrolar simples, mas com decisões difíceis. É preciso saber equilibrar os interesses a curto, médio e longo prazos. As primeiras épocas são muito importantes para se definir um caminho a seguir para obter um resultado melhor nas últimas rodadas.
O fato de poder escolher as famílias de deuses que serão usadas na partida é excelente, pois o jogo muda bastante com famílias de deuses diferentes, e isso contribui muito para manter o interesse nele por um longo tempo. Só a título de ilustração, comentamos abaixo as mudanças que o jogo sofre em algumas situações:
- Com Ares em jogo: A disputa pelos pontos de prestígio que só são obtidos com cartas desse deus se torna grande, tendo em vista que quem tiver mais pontos de prestígio receberá 16 pontos de vitória no final da partida! É uma pontuação que não dá muito para ignorar em um jogo que por si só já é muito disputado.
- Com Apolo em jogo: As cartas do Oráculo adicionam mais uma camada estratégica ao jogo, tendo em vista que é possível planejar sua rodada atual já pensando nas cartas que estarão no Agora da próxima época. As cartas de Apolo permitem adquirir ou mesmo utilizar os efeitos e poderes de cartas que ainda estão no Oráculo, o que pode ser devastador dependendo do momento da partida.
- Sem Hefesto em jogo: Fica bem mais difícil acumular ouro, e ouro é fundamental para transferir cartas para o Elysium.
- Sem Hades em jogo: Suas transferências ficam limitadas ao que conseguir obter em quests, ou seja, transferir cartas para o Elysium fica bem mais difícil.
- Com Poseidon em jogo: Há mais caos na mesa, pois as cartas dessa família causam efeitos destrutivos, como destruir cartas no domínio de um ou mais jogadores, faz com que os jogadores percam dinheiro, dentre outros.
Há uma gama muito interessante de poderes nas cartas, desde poderes ativados, instantâneos, de gatilho (trigger) que só podem ser usados uma vez, poderes permanentes, de lenda ou mesmo de Chronos. Isso tudo somado à variabilidade de deuses escolhidos faz com que dificilmente uma partida de Elysium seja monótona.
Portanto, Elysium é uma excelente opção para quem deseja um jogo competitivo, em que é preciso pensar e tomar decisões. Os componentes são lindos, a temática e a arte são chamativas. As partidas não são longas e não se sente o tempo passar enquanto se está jogando. E o mais importante: é divertido, de verdade.