PUBLICADO ORIGINALMENTE EM http://onboardbgg.com/2016/03/04/sobre-a-mesa-k2/
por Fillipe Vieira

“K2 é a segunda maior montanha do mundo (depois do Monte Everest) com uma altura de 8.611 metros (28.251 pés) acima do nível do mar. É também considerada uma das mais difíceis das montanhas de seu porte – K2 nunca foi conquistada durante o inverno.
Agora sua equipe está em sua sombra, pronta para escalar até o pico em busca de glória e fama. Você sabe o que o aguarda – constantes mudanças climáticas, uma trilha íngreme e traiçoeira, e a falta de oxigênio serão seus inimigos mais mortais nesta expedição perigosa. Você terá que planejar cada passo cuidadosamente, tirar bom proveito dos dias mais limpos, e competir com outras equipes prontas para tomar a glória para si.”
Uma das capacidades mais fantásticas dos jogos de tabuleiro é de possibilitar que as pessoas assumam papéis que nunca imaginaram na sua vida. De forma lúdica, os jogadores experimentam situações extremas, interpretam, fazem escolhas difíceis, exploram mundos desconhecidos, mas em uma zona confortável, na companhia de amigos. Em K2, jogo de 2010 criado por Adam Kaluza (mesmo designer de Drako), os jogadores são convidados a embarcar em uma jornada perigosa, tomando controle sobre uma equipe de alpinistas experientes no seu desafio pessoal de alcançar o topo de uma das montanhas mais perigosas do mundo. Conhecido pelos bravos escaladores que o enfrentam como “uma entidade de humor oscilante,” o K2 tem uma alta taxa de mortalidade (de cada quatro que chegaram ao topo, uma pessoa morreu), portanto, o gigante deve ser respeitado. E apesar de ser um jogo leve, de regras fáceis, esse clima de ameaça constante é muito bem retratado.

Mecânica
– Administração de cartas
– Eliminação de jogadores
– Movimento de ponto a ponto
– Seleção simultânea de ações
O objetivo do jogador é fazer com que seus alpinistas alcancem o topo da montanha antes da equipe dos outros jogadores, ao mesmo tempo que toma cuidado para que eles não morram durante a jornada devido aos perigos apresentados pela montanha. O andamento do jogo é muito simples. Os jogadores usam baralhos com cartas idênticas. As cartas são usadas para mover os alpinistas pelas rotas mostradas no tabuleiro de jogo, ou para aclimata-los. Também é possível armar duas tendas da sua equipe durante o percurso. Essas tendas servirão para que seus alpinistas esperem em um local mais seguro por melhores condições climáticas e, então, seguir com a expedição.
As equipes preparam-se para o desafio.
Uma partida dura 18 rodadas controladas por um marcador em peças de clima que irão interferir no avanço dos alpinistas no decorrer da partida. Com exceção da fase de ação, todas as fases da rodada são jogadas simultaneamente pelos jogadores. As fases de uma rodada são:
1 – Seleção de Cartas: Os jogadores compram 6 cartas de seus baralhos. Então, escolhem 3 cartas das 6 que compraram para sua mão e as colocam em sua frente com a face para baixo. Quando todos os jogadores selecionarem suas 3 cartas, todas são reveladas simultaneamente.
2 – Marcadores de Risco: Os jogadores somam os valores das cartas de movimento dentre as 3 cartas que jogaram. Valores das cartas de aclimatação não são adicionados nesta soma. O jogador com a maior soma (aquele que assumiu o maior risco na escalada) escolhe um dos 3 marcadores de risco revelados. Durante a fase de ações (fase 3), o jogador deve descontar o valor do marcador de risco que pegou. Essa é uma visível solução para equilíbrio de jogo.
3 – Fase de Ação: Durante a fase de ação, cada jogador terá sua vez separadamente para realizar ações baseadas nas 3 cartas que escolheu para aquela rodada. Começando com o jogador que possui o marcador de jogador inicial e seguindo em sentido horário, os jogadores podem mover seus alpinistas pelos espaços adjacentes no tabuleiro (eles possuem cordas que os ligam entre si), aumentar o nível de aclimatação de seus alpinistas, ou colocar suas duas tendas disponíveis livremente em um espaço ocupado por um de seus alpinistas no momento (depois de colocadas, as tendas não poderão ser retiradas ou movidas).
Os alpinistas avançam e montam suas tendas em um ponto estratégico.
Os alpinistas moverão o equivalente ao que está descrito nas cartas de movimento, mas o jogador deverá definir com qual de seus dois alpinistas ele estará usando cada carta. Esses valores não podem ser distribuídos, ou seja, pode haver casos em que jogadores não poderão usar movimentos restantes de uma carta, pois existem alguns espaços no tabuleiro que possuem custos de movimento, representando o quão difícil é para superar aquele trecho. Da mesma forma, o jogador pode definir quais de seus alpinistas se beneficiará das cartas de aclimatação que usou. Aumentar os pontos na trilha de aclimatação do alpinista é importante, porque se esse valor chegar a zero, o alpinista estará morto devido ao frio e a falta de oxigênio (mais sobre isso depois). Se o jogador possuir um marcador de risco nesta fase, ele deve reduzir de uma de suas cartas de movimento ou de aclimatação (ou da própria trilha de aclimatação de um de seus alpinistas) o valor apresentado no marcador.

Depois de horas de escaladas e caminhadas, aquele descanso… Lindas ilustrações.
Conforme o jogador avança na escalada, ele vai “fixando bandeiras” em alguns pontos (o marcador de pontos daquele alpinista avança na trilha de pontuação até o valor mais alto dentre as bandeiras que ele alcançou no tabuleiro). Um aspecto importante sobre o movimento é que os alpinistas de um jogador trancam a passagem dos alpinistas dos outros jogadores devido a um limite determinado pela altitude em que se encontram e o número de jogadores na partida. Eles podem passar uns pelos outros contando que possam pagar pelos custos de movimento, mas não podem parar no mesmo espaço. Algumas condições climáticas também dificultam a subida, como o aumento de custo de movimento quando estiver nevando mais forte, por exemplo.
4 – Checar Aclimatação: Neste momento da rodada os jogadores devem somar ou descontar pontos das trilhas de aclimatação de seus alpinistas de acordo com a situação em que cada um deles se encontra. Se o alpinista está em um espaço no tabuleiro com um valor em azul (aclimatação favorável), ele recebe aquela quantidade de pontos de aclimatação. Se estiver em um espaço com um valor em vermelho (aclimatação desfavorável), ele deve descontar este valor de sua trilha de aclimatação. Também deve-se observar o espaço que o marcador de clima está ocupando naquela rodada, porque dependendo da altitude em que os alpinistas se encontram na montanha neste momento, pode haver mais redução na sua aclimatação. Se neste momento o jogador estiver em um espaço que contenha uma tenda da cor da sua equipe, ele recebe um ponto de aclimatação.
Se o valor de aclimatação de um alpinista chegar a zero, ele morre e passa a valer apenas 1 ponto de vitória para aquele jogador.
O frio intenso e a altitude dificultam a respiração. A falta de oxigênio é um perigo constante.
5 – Final da Rodada: O jogador à esquerda do jogador inicial recebe o marcador de jogador inicial.
Então, o marcador de clima avança um espaço nas peças de clima. Cada uma dessas peças possui 3 espaços (cada um representando um dia) para a passagem desse marcador. Elas podem ser de verão ou inverno, sendo as peças de clima de inverno geralmente as que trazem mais perigo aos alpinistas.
O jogo termina ao final da décima oitava rodada (pode parecer muito, mas as rodadas passam rapidamente). O jogador que possuir a maior soma de pontos de vitória com seus dois alpinistas é o vencedor. Se houver um empate, vence o jogador que chegou ao pico primeiro, se o empate persistir, os que fizeram mais pontos compartilham a vitória.
O instável humor da montanha.
Considerações Finais
Ninguém melhor que um alpinista para fazer um jogo sobre alpinismo, não é verdade? Pois devo admitir, Adam Kaluza é um alpinista inteligente e criativo que soube retratar com perfeição a tensão e as dificuldades das quais somente suas experiências reais poderiam servir de inspiração.
Em uma primeira vista, K2 pode erroneamente ser considerado um jogo do tipo “corrida.” Na verdade, K2 é um jogo de superação. Chegar primeiro ao topo é, de fato, a primeira forma de decidir um empate entre os que conseguiram alcançar a façanha, mas de nada adianta chegar ao topo sem planejar a decida. A bandeira fixada na maior altitude que um alpinista alcançou é sempre imediatamente atualizada na trilha de pontos, ou seja, não há problemas em descer com o alpinista depois disso. Aliás, isso provavelmente será necessário se você não quiser correr o risco de perder seu alpinista castigado pelo clima impiedoso nas regiões mais altas da montanha.
São poucas as escolhas a serem feitas, como quais de seus dois alpinistas mover em determinado momento, qual das rotas pegar, quais das 6 cartas da mão escolher pra usar numa rodada, ficar e esperar por um melhor clima ou arriscar uma subida forçada… Mas o jogo é apertado e as decisões difíceis. Ele pode ficar especialmente caótico em uma partida com mesa cheia, cinco jogadores, onde as equipes atrapalharão a subida umas das outras.

As equipes disputam espaço pelas passagens estreitas e traiçoeiras.
O fator sorte é bem controlado, apesar dos jogadores comprarem de um baralho de cartas, todos possuem um baralho igual (ou seja, as mesmas condições de serem bem sucedidos), você escolhe 3 cartas pra usar e, de certa forma, já se prepara para a rodada seguinte com algumas cartas específicas. A decisão de quais cartas usar e quais deixar para a próxima rodada pode ser influenciada pela “previsão do tempo,” as condições dos espaços de clima por onde o marcador passará nas próximas rodadas.
Entre um dos fatores de destaque, está a possibilidade de jogo solo. Também é possível ajustar a dificuldade do jogo de diferentes formas (lados diferentes do tabuleiro, uma carta que salva seu alpinista uma única vez na partida, usar somente peças de clima de verão ou inverno ou ainda qualquer mistura delas), o que o torna um jogo acessível a iniciantes, mas que também pode ser muito bem aproveitado por jogadores mais experientes. Por fim, apesar do clima de tensão, K2 é um jogo familiar super simples, acessível a qualquer jogador, com proposta interessante e temática inovadora, que certamente merece ser conhecido por todoboard gamer.
Pontos Positivos
– Relação entre temática e mecânica muito bem executada
– Um interessante desafio
– Regras fáceis de aprender e explicar
Pontos Negativos
– Eliminação de jogadores
– Pode ser um jogo simples demais para o gosto de alguns jogadores