Segunda-feira tive a oportunidade de participar do primeiro playteste público do
Space Cantina, o principal projeto da
Ace Studios para 2016, que rolou na
Redbox Store. A editora carioca liderada por Fel Barros, game designer do
Warzoo, apresenta uma proposta ambiciosa com esse novo jogo. Apesar de leve e divertido,
Space Cantina é bem mais complexo do que todos os outros lançamentos já realizados. A
Ace Studios é conhecida pelo
Warzoo, que está tendo distribuição pela
Galápagos Jogos, e mais recentemente o
Sapotagem, primeiro com distribuição própria. Entre os dois, tivemos o
Muffin Games e o
Gekido que foram lançados de forma quase artesanal, em edições bem limitadas. Todos eles são party games pequenos, tanto em componentes quanto em regras. Não uso a palavra simples, porque são jogos que oferecem muitas possibilidades, o que considero admirável.
O que sinto observando a trajetória da
Ace Studios até o momento, é que eles estavam testando a si mesmos e o mercado. A opção por investir em um jogo de maior porte ao invés de continuar na linha dos jogos pequenos mostra uma evolução da editora, algo que considero bastante animador, apesar do receio que tenho de estar sendo um passo um pouco rápido demais. Sentiria mais segurança se antes do
Space Cantina tivéssemos ainda mais uns dois pequenos. Temos a promessa que o
Sapotagem foi o primeiro de uma linha de quatro jogos, o próximo seria o
Encantados. Não que eu duvide da capacidade de criação de um jogo de maior porte, mas confesso que tenho preocupações sobre as questões práticas relacionadas a produção e distribuição.
O Space Cantina é um Euro leve, de tamanho médio e com uma temática bem humorada. Cada jogador gerencia um restaurante e vence quem terminar com mais dinheiro. Existem três tipos de recurso no jogo: comida, bebida e sobremesa. Os jogadores começam com um recurso de cada tipo, uma carta de garçom e um objetivo secreto. Outros objetivos ficam abertos na mesa e podem ser pegos no exato momento que forem cumpridos, eles não são repostos. A quantidade de turnos varia de acordo com a quantidade de jogadores. Cada turno é composto por quatro ações que são realizadas de forma intercalada.
Ignore a segunda carta de garçom e temos o setup.
Existem dois tipos de cartas no jogo: funcionários e clientes. Uma mesma quantidade de ambas estará disponível na mesa para compra. Os funcionários são cartas que produzem recursos, eles entram como garçons. Como o jogador já começa com um, então sobram apenas mais dois espaços disponíveis para esse tipo de carta. Ao pegar uma carta de funcionário, já tendo todos os espaços de garçons preenchidos, o jogador tem duas opções: vender um garçom para abrir espaço para o novo ou promover de acordo com o indicado na carta do funcionário, ele pode virar gerente, maitre ou cozinheiro. Cada uma dessas funções oferece uma vantagem distinta acumulativa, pois não existe limite de cartas que podem ser colocadas nesses espaços. Mas o jogador precisará pagar por eles no final do jogo, então é bom ir fazendo as contas com atenção.
Começando a liberar o plano de carreira da galera.
Os clientes são as cartas que consomem os recursos e em troca nos dão dinheiro, alguns são críticos, isso é indicado por uma estrela na carta. Atender esse tipo de cliente dá benefícios adicionais. Mas os clientes precisam ser atendidos no mesmo turno que em são pegos. Caso o turno termine e ele não seja atendido, o jogador recebe um marcador de insatisfação, acumulando três desses no mesmo cliente, ele vai embora. Para cada marcador de insatisfação, o jogador perde dois pontos no final do jogo. Não é fácil se livrar desses marcadores.
Cliente aguardando atendimento. Nessa foto dá para ver os objetivos.
Esse cliente merece ser apreciado mais de perto.
Tanto para gerar recurso com seus garçons quanto para consumir com seus clientes é necessário ter um dado com um valor específico. São três raças que passam pelo nosso restaurante, aliens, ciborgues e robôs. Por isso, temos três cores de dados diferentes no jogo. Não é obrigatório combinar a cor do dado com a carta, mas quando isso ocorre, o jogador avança na trilha de fidelidade correspondente da raça, o que lhe oferece benefícios imediatos e de fim de jogo. Os dados são rolados no início do turno e ficam disponíveis para compra. É possível gastar um recurso para modificar o valor de um dado para um número a mais ou a menos. Cada restaurante também possui uma habilidade especial exclusiva.
Tabuleiro geral do jogo.
Minha habilidade era modificar o dado em dois gastando um recurso, então foquei mais em atender os clientes com prontidão e, de preferência, aqueles que tivessem estrelas. Tanto que passei um bom tempo do jogo na frente. Optei por não promover funcionários, vendi bastante nos primeiros turnos quando eles valem mais, pois não queria chegar no final tendo que perder dinheiro pagando salários. Só que depois, comecei a ter dificuldade para produzir os recursos, precisava acumular muito para atender os clientes dentro do turno e ficar mudando os dados. Tinha um objetivo de atender seis clientes disponível na mesa, fiquei travada no quinto. Quem ganhou a partida foi o Lucas (ilustrador do jogo) e eu fiquei em segundo, então foi como se eu tivesse vencido. O restaurante dele tinha uma habilidade muito boa de limpar marcadores de insatisfação.
Lucas (ilustrador), Felipe, Warny (game designer), Lucas e Eu.
Apesar de alocação de dados ser a principal mecânica do jogo, senti faltava de uma presença maior dela. Esperava por algo mais no estilo Alien Frontiers, de combinação de dados. Acho que as trilhas de fidelidade precisam ser melhoradas, achei desproporcional os benefícios concedidos. A parte das estrelas está confusa tanto visualmente quanto sobre a relação com a trilha de fidelidade. As possibilidades de mudar resultado de dado deveriam ser mais limitadas. Acredito que seria interessante acrescentar um sinal de + entre o dado e os recursos nas carta de cliente, daria mais clareza. Por fim, o jogo poderia ter algum tipo de marcador de contagem de ações. Os dados não têm um local muito preciso para alocação, então acabam ficando meio solto, podendo gerar confusão na mesa. Não sei se seria viável a criação de mais um tabuleiro para colocação do que está disponível para compra.
Mas, no geral, o jogo agradou bastante. As regras são simples e fáceis de entender. O tempo de duração é bom e o downtime é muito pequeno (nossa partida deve ter durado uma hora e meia contando com a explicação), as paródias nas cartas são divertidas e a estrutura mecânica está bem sólida, apesar de achar que algumas coisas precisam ser melhoradas. A contagem da pontuação no final também está bacana, porque não deixa quem está mais para trás desanimar, talvez pudessem acrescentar pontos por recursos. Só é possível pontuar com eles com objetivo secreto específico. Gostei da utilização de set collection, apesar de só ter usado uma vez no jogo, achei que combinou bem com o tema.
Como todos os demais jogos da Ace Studios, a arte do Space Cantina também está sensacional. Um trabalho incrível do Lucas Ribeiro, acredito que as cartas e tabuleiros individuais devam mudar muito pouco. Gostei muito do estilo. Ele tem humor, mas não é bobo. Como fã de FC, gostei de referências mais obscuras, não apenas aquelas mais conhecidas. Só o tabuleiro principal e os objetivos (principalmente) é que ainda precisam ser trabalhado. É bom que essa parte já esteja bem avançada, afinal isso é uma das questões que mais empacam lançamentos de jogos.
A ideia é que o jogo entre em financiamento coletivo ainda no primeiro semestre desse ano. Ainda não estimativa de valores. Eles devem percorrer os eventos para fazer divulgação. Espero conseguir tê-los presentes no Guadalupeças de março (não haverá evento em fevereiro por conta do Carnaval). É um projeto que vale a pena acompanhar. Apesar de ter feito diversas críticas, acho que vai ser mais um jogo nacional de qualidade para a coleção. Acredito que a medida que os playtestes forem sendo realizados, eles vão fazer os ajustes necessários.
Publicado originalmente em: http://turnoextra.blogspot.com.br/2016/01/primeiras-impressoes-space-cantina-na.html